quarta-feira, 27 de abril de 2011

..."já senti na pele o fazerem-nos mal, sem ser sem querer.Já me arrependi de coisas que disse e deixei por dizer. Já me irritei muito, comigo mesmo, por precipitar-me. Mas também por não agir a tempo. Já fiquei muito magoado com pessoas a quem hoje falo sem azedume, embora sem afecto também. Já me comovi sem ninguém notar, muitas vezes. Já não me faz impressão almoçar sozinho. Já me apeteceu ir ao aeroporto e apanhar o primeiro avião, fosse para onde fosse; mas não fui. Já me arrependi de ter confiado. Já estive quase a tomar decisões que hoje sei que teriam sido um disparate. Já fiz alguns disparates. Já fui feliz muitas, muitas vezes, mesmo. Já me senti muito, muito só, mesmo com gente à minha volta. Já andei de carro horas a fio, sem destino certo. Também já andei centenas de quilómetros só para ir a um determinado restaurante. Já me senti iluminado pela sabedoria dos meus filhos, sem eles imaginarem. Já me senti muitas vezes injustiçado, e custa-me muito. Já tomei decisões muito difíceis e depois percebi que fiz bem. Já chorei de saudade. Já fiquei sem gasolina na A1. Já me surpreendi com coisas que cozinhei, tão boas que ficaram. Já contei histórias para uma fotografia. Já comecei a escrever um livro várias vezes e tenho portanto vários livros não acabados. Já acreditei que devia editar coisas que escrevo. Hoje duvido. Já magoei pessoas me eram muito, muito queridas. Já tive a alma em farrapos. Já fui ao cinema sozinho. Já me arrependi de ter ido a determinados concertos. Já sonhei que artistas que conheço cantavam palavras minhas. Já gravei um anúncio. Já fiz voluntariado. Já tive um cão. Já toquei em Nélson Mandela (na ilusão de poder falar com ele. Um segurança encarregou-se de me afastar, decidido). Já votei em branco. Já cheguei atrasado a uma reunião porque fiquei a ver chover. Já não acredito em políticos. Já ouvi alguns discos milhares de vezes e volto sempre a alguns deles. Já passei horas em livrarias, só folhear, aqui e ali. Já sonhei que voava.“

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